Efeito do metabolismo mineral na endometrite citológica em bovinos leiteiros

Abstract

As flutuações da calcemia que ocorrem no periparto de bovinos leiteiros têm sido apontadas como fator risco para o desenvolvimento de endometrite subclínica (ES). O estudo desta relação é complexo devido à variabilidade e complexidade do período de transição. No primeiro capítulo, realizamos uma revisão de literatura sobre modelos experimentais que permitem o estudo da relação entre hipocalcemia e endometrite sem o uso de vacas em transição. No segundo estudo, buscamos avaliar a relação entre calcemia e ES em uma série de experimentos. No Experimento 1, os níveis séricos de Cálcio (Ca) de 26 vacas 24 h pós-parto foram mensurados e correlacionados com a incidência de ES entre 34 e 40 dias pós-parto (PP). A contagem de leucócitos polimorfonucleados (PMN) entre 34 e 40 dias PP foi afetada pela calcemia nas primeiras 24 h PP (P≤0,01). No Experimento 2, vacas (n=47) foram classificadas em normocalcêmicas (Ca≥8,5mg/dL) ou hipocalcêmicas (Ca<8,5mg/dL) sendo aleatoriamente distribuídas para receber ou não formiato de Ca oral 6 e 30 h PP, sendo avaliada a incidência de ES entre 34 e 40 dias PP. O tratamento com formiato de Ca reduziu a contagem de PMN (P<0,05), reduzindo a incidência de ES (P<0,05). Para cada aumento de 1 mg/dL de Ca sérico, a incidência de ES reduziu em 27%. No Experimento 3, vacas holandesas multíparas foram alocadas nos grupos: Controle (n=2), que recebeu infusão intravenosa (IV) de NaCl 0,9%; ou hipocalcemia subclínica induzida (iHSC) (n=3), que recebeu solução IV 5% de etileno diaminotetracético dissódico (Na2EDTA) por 45 min. Todos os indivíduos receberam ambos os tratamentos com um intervalo de três semanas, em um modelo do tipo crossover 2x2. Os níveis de Ca ionizado (iCa), Ca total (tCa) e magnésio (Mg) foram mensurados imediatamente antes do início dos tratamentos (M0), em 15 (M1), 45 min (M2, fim das infusões) e 3 h após o fim dos tratamentos (M3). Além disso, glicose, insulina, ácidos graxos não-esterificados (AGNEs) e β-hidroxibutirato (BHB) foram mensurados no M3. Todos os animais receberam 300μg de lipopolissacarídeos (LPS) intrauterino no M2 e, após 3 h (M3), uma biópsia endometrial foi realizada. No M0, os valores de iCa eram de 3,88±1,08 e 3,92±1,31 mg/dL e no M2 eram de 1,84±1,51 e 3,84±1,22 mg/dL para os grupos iHSC e controle, respectivamente. Apesar disso, não houve diferença na expressão endometrial de IL-6, IL-8 e TNFα, em 3 h após o desafio intrauterino com LPS. O grupo iHSC apresentou redução significativa dos níveis séricos de BHB comparado ao grupo controle, porém não houve diferença nos níveis séricos de glicose, insulina, AGNEs e na expressão endometrial dos genes INSR, IRS1, IGF1, GLUT1 e GLUT3. O estado de iHSC não causou alterações significativas na expressão endometrial de citocinas inflamatórias e não afetou a via de sinalização de insulina no tecido endometrial 3 h após o desafio intrauterino com LPS. Novos estudos são necessários para elucidar a intricada relação entre a homeostase do Ca, metabolismo energético e saúde uterina em bovinos leiteiros.

Serum calcium fluctuations during the peripartum period of dairy cattle have been identified as an important risk factor for the development of subclinical endometritis (SE). The study of this relationship is complex due to the variability and complexity of the transition period. In the first chapter, we carried out a literature review on experimental models that allow the study of the relationship between hypocalcemia and endometritis without transitioning cows. In the second study, we sought to evaluate the relationship between calcemia and SE in a series of experiments. In experiment 1, serum calcium (Ca) levels of 26 cows 24 hours postpartum were measured and correlated with SE incidence between 34 and 40 days postpartum (PP). The polymorphonucleated leukocyte (PMN) count between 34 and 40 days PP was affected by calcemia in the first 24 hours PP (P≤0.01). In experiment 2, cows (n=47) were classified as normocalcemic (Ca≥8.5mg/dL) or hypocalcemic (Ca<8.5mg/dL) and were randomly distributed to receive or not oral Ca formate 6 and 30 hours PP, the incidence of SE between 34 and 40 days PP was evaluated. Ca formate treatment reduced PMN count (P<0.05), reducing the incidence of SE (P<0.05). For every 1 mg/dL increase in serum Ca, the incidence of SE reduced by 27%. In experiment 3, multiparous Holstein cows were allocated to the following groups: Control (n=2), which received intravenous (IV) infusion of 0.9% NaCl; or induced subclinical hypocalcemia (iSCH) (n=3), who received a 5% IV solution of disodium ethylene diaminetetraacetic acid (Na2EDTA) for 45 minutes. All cows received both treatments, 3 weeks apart in a 2x2 crossover model. The levels of ionized Ca (iCa), total Ca (tCa) and magnesium (Mg) were measured immediately before the start of treatments (M0), at 15 (M1), 45 min (M2, end of infusions) and 3 h after the end of treatments (M3). Furthermore, glucose, insulin, non-esterified fatty acids (NEFAs) and β-hydroxybutyrate (BHB) were measured in M3. All animals received 300μg of intrauterine lipopolysaccharide (LPS) in M2 and, after 3 h (M3), an endometrial biopsy was performed. At M0, iCa values were 3.88±1.08 and 3.92±1.51 mg/dL and at M2, 1.84±1.31 and 3.84±1.22 mg/dL for the iSCH and control groups, respectively. Despite this, there was no difference in the endometrial expression of IL-6, IL-8 and TNFα at 3 hours after uterine LPS challenge. The iSCH group showed a significant reduction in serum BHB levels compared to the control group, but there was no difference in serum levels of glucose, insulin, NEFAs and in the endometrial expression of the INSR, IRS1, IGF1, GLUT1 and GLUT3 genes. The iHSC did not cause significant changes in endometrial expression of inflammatory cytokines and did not affect the insulin signaling pathway in endometrial tissue 3 hours after intrauterine LPS challenge. Further studies are necessary to elucidate the intricate relationship between Ca homeostasis, energy metabolism and uterine health in dairy cattle.