Organização anátomo-funcional do olho do caracol terrestre Megalobulimus abbreviatus

Abstract

Os olhos do molusco gastrópode estilomatóforo Strophocheilus, espécie relacionada ao Megalobulimus abbreviatus, foram descrito apenas em microscopia óptica, restando dúvidas sobre a presença de dois tipos de fotorreceptores e de células ganglionares (ou células sensoriais de segunda ordem), o que, inclusive, é uma controvérsia que se estende às demais espécies de estilomatóforos. Com o objetivo principal de contribuir a esta questão, o presente trabalho propõe uma análise ultra-estrutural da retina do caracol M. abbreviatus e questiona, ainda, sobre a existência de células gliais na retina de M. abbreviatus, já que, curiosamente, não temos encontrado referência alguma sobre a presença de glia na retina nos moluscos gastrópodes. Juntamente com a imuno-histoquímica de proteína fibrilar acídica glial, também foi realizada a imuno-histoquímica de serotonina, com intuito, de iniciar uma análise neuroquímica da retina desta espécie. Descrições gerais no âmbito da microscopia óptica foram, ainda, realizadas para fins de comparação com os dados apresentados para a outra espécie de caracol nativo relacionada. Os resultados indicam que o olho de Megalobulimus abbreviatus permitiria a formação de uma imagem de muito pouca resolução, pois a lente esférica fixa tem aspecto homogêneo (o que dificulta a formação de imagem), mas está afastada da retina por um espaço (corpo vítreo) que parece ser até maior nesta espécie, em relação a outros caracois pulmonados de menor porte, o que poderia auxiliar no foco. Existem na retina de M. abbreviatus duas células com características sensoriais, mas a célula sensorial I parece ser a principal candidata a atuar como fotorreceptor com maior sensibilidade fótica, representando o tipo rabdomérico de fotorreceptor. Na retina há, ainda, a presença de células pigmentares. Um número menor de pigmentos na retina de M. abbreviatus e a localização mais basal das células pigmentares, não estando dispostas entre as células fotorreceptoras, podem estar associados com o hábito noturno e a uma possível tolerância menor à luz desta espécie. Os fotorreceptores de M. abbreviatus projetam-se diretamente ao nervo óptico, sem realizar sinapse. A ausência de interneurônios e de células ganglionares indica uma organização retinal mais simples, de forma que a integração do sinal deve ocorrer nos gânglios cerebrais. A imunorreatividade à GFAP na retina de um molusco gastrópode foi descrita pela primeira vez no presente trabalho. A presença de células gliais junto à porção basal da retina confere com a identificação ultra-estrutural de células com aspecto glial. A presença de serotonina-imunorreativa junto à cápsula conjuntiva do olho pode ser oriunda de projeções dos gânglios cerebrais.

The eyes of the gastropod mollusk Strophocheilus, a stylommatophoran species related to Megalobulimus abbreviatus, were described only at the light microscopic level. Doubts remain concerning the presence of types of phototoreceptors and ganglion cells (or second order sensorial cells). This is, indeed, a controversial issue for gastropods in general. The aim of this study is to contribute to clarify this issue with an ultrastructural approach of the retina of the snail M. abbreviatus. As we are not aware of studies about the existence of glial cells in the retina of gastropods, this study includes an immunohistochemical identification of glial fibrillary acidic protein (GFAP). The immunohistochemical localization of serotonin in this snail retina was also determined in order to contribute to the neurochemical study of the visual system in this species. General descriptions at the light microscopic level were also performed for comparison with the previously reported data for Strophocheilus. The results indicate that the eyes of M. abbreviatus provide a very low resolution image, as the lens has a homogenous aspect. However, the distance from the lens to the retina, vitreous body region, appears to be larger in this species than in other pulmonate snails, a feature that could help to achieve focus. The retina of M. abbreviatus has two types of cells with sensorial characteristics, but sensorial cell type I possibly represents the main photoreceptor, with a great number of microvilli, like a rhabdomeric photoreceptor. Sensorial cell type II has cilia and fewer microvilli. There also are pigmented cells located in a more basal portion of the retina, and not around the apical parts of photoreceptors. The location of the pigmented cells at the basal portion of the retina may be related to a nocturnal habit and low tolerance to light of this species. The photoreceptor axons of M. abbreviatus constitute the optic nerve. The absence of interneurons, ganglion cells or synaptic terminals in the plexiform layer suggests a simpler retinal organization. The synaptic integration must occur in the cerebral ganglia. To the best of our knowledge, this is the first identification of GFAP immunoreactivity in a gastropod retina. The presence of cells with glial aspect - at ultrastructural level - in the basal portion of the retina is according to the location found for GFAP immunoreactivity. The serotonin-immunoreaction is located near the connective capsule of the eye and may originate from the efferent projections from cerebral ganglia.