Educação das relações étnico-raciais e desestabilização de subjetividades em formação continuada de professoras no Curso UNIAFRO/UFRGS (2013-2014)

Abstract

A análise apresentada nesta tese foi construída a partir da leitura, interpretação e reflexão sobre 1.369 registros produzidos por 346 professoras-cursistas que participaram da 1ª e 2ª edições .do Curso de Aperfeiçoamento UNIAFRO: Política de Promoção de Igualdade Racial na Escola, financiado pelo Ministério de Educação - MEC e Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, ofertado na Universidade Federal do Rio Grande do Sul nos anos de 2013 e 2014. Tem como objetivos principais: 1. descrever as duas edições do curso, praticado no contexto singular das relações raciais no Brasil meridional, considerando os marcos legais das políticas de implementação das ações afirmativas no campo da educação no Brasil; 2. compreender a constituição de arranjos nas subjetividades das professoras-cursistas, no que diz respeito à pertença racial e às relações raciais, a partir de suas apropriações quanto às experiências de formação propostas pelo curso. Para produzir e tratar os dados foram mobilizadas estratégias metodológicas alinhadas a) à análise do discurso e estabelecimento de categorias por acervo (BARDIN,2008), b) ao conceito bourdieusiano de vigilância epistemológica (BOURDIEU, 1999) e c) aos conceitos de sociologia em hábito e sociologia em ato de Alberto Guerreiro Ramos (1996). As reflexões sobre as políticas de ações afirmativas estão fundamentadas, sobretudo, em autores nacionais que discutem as relações raciais brasileiras sob uma ótica sociológica que considera a história de formação da nossa sociedade e reconhece, portanto, a importância desse processo para a criação das estruturas racistas que ainda hoje a sustentam, mas que também apontam a necessidade de compreender e reconhecer a agência das pessoas brancas na produção e manutenção do racismo na contemporaneidade. Consideram, também, os capitais bourdieusianos (1986;2011) e as contribuições de Nancy Fraser (2001) sobre os dilemas da justiça social. No campo específico do currículo escolar e de suas implicações na transformação das subjetividades das professoras-cursistas, são mobilizados autores nacionais dedicados à discussão a) da educação das relações étnico-raciais; b) dos estudos críticos da branquitude; c) da psicologia social do racismo e d) da educação como processo emancipatório. Da análise pretendida conclui-se que: a) 99% das professoras-cursistas operam o conceito de raça a partir de noções das teorias racialistas do final século XIX e início do século XX ou o rejeitam por acreditar que ele, por si só, instaura o racismo sendo, portanto, impróprio para a luta antirracista; b) as situações formativas experimentadas no curso que promoveram o rompimento do silêncio escolar sobre foram imprescindíveis no processo de construção dos conhecimentos necessários para a desestabilização de suas subjetividades, possibilitando a compreensão do conceito de raça a partir da perspectiva reivindicada pelo movimento negro e articulada aos projetos e políticas de ações afirmativas no Brasil.

The present analisys was built upon reading, comprehension and reflexion on 1.369 registers produced by 346 participant teachers who have joined 1st and 2nd editions of the “Course of Development UNIAFRO: Policy of Racial Equality Promotion at School, sponsored by the Ministério de Educação - MEC and Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, offered by Universidade Federal do Rio Grande do Sul in 2013 and 2014. Its main goals are: 1. describing the two course editions, practiced in the singular context of racial relations in the Southern Brazil, considering the legal frameworks based on the polícies of implementation of affirmative actions in the field of education in Brazil; 2. understanding the constitution of arrangements in the participant teachers’ subjectivities, related to racial belonging and interracial relations, starting from their appropriations towards the molding experiences proposed by the course. In order to treat and produce data, strategies which were aligned to a) the discourse analysis and the stablishment of categories by collection (BARDIN,2008), b) Bourdieu’s concept of epistemological vigilance (BOURDIEU, 1999) and c) the concepts of sociology in habit and sociology in act of Alberto Guerreiro Ramos (1996) were mobilised. The reflections upon the policies of affirmative actions are based, above all, on national authors who debate Brazilian race relations under a sociological view which considers our society’s history formation and acknowledges, therefore, the importance of this process to the generation of the racist structures that mantain it until the present days, however pointing towards the need of comprehending and acknowledging white people’s performance in producing and maintaining racism in contemporary time. They also consider Bourdieu’s capitals (1986;2011) and Nancy Fraser’s contributions (2001) about social justice dilemmas. In the specific field of school curriculum and its implications for tranforming participant teachers’ subjectivities, national authors dedicated to debate a) education on ethnic-racial relations; b) critical whiteness studies; c) racism social psychology and d) education as an emancipatory process are mobilised. From the intended analysis, it was possible to conclude that: a) 99% of the participant teachers operate race concept departing from notions derived from racialist theories dated from the end of the 19th century and the begining of the 20th century or reject it for believing it can, on its own, install racism and therefore being inappropriate to the antiracism fight; b) the formative situations experienced during the course which promoted the breaking of the school silence about racism were essential in the process of building the needed knowledge to destabilise their subjectivities, enabling the comprehension of race concept from the perspective claimed by the black movement and being articulated to the projects and policies of affirmative actions in Brazil.