Negociações sobre biodiversidade além da jurisdição nacional : atores nacionais e contexto institucional

Abstract

O uso sustentável e a conservação da biodiversidade além da jurisdição nacional (BBNJ) permanecem sem quadro institucional unificado para regulação. Sendo percebida como uma lacuna na governança dos oceanos, a questão tornou-se objeto de negociações multilaterais, culminando na Conferência Intergovernamental para estabelecimento de instrumento legal vinculativo internacional sobre BBNJ, iniciada em 2018 e em curso. O objetivo desta monografia é compreender o processo de negociação sobre BBNJ a partir da relação entre os atores nacionais, representados por suas delegações, e o contexto institucional. Utiliza-se de abordagens construtivistas e da Escola Inglesa, considerando a co-constituição entre agência e estrutura dentro de um institucionalismo sociológico e histórico. São empregados métodos quali-quantitativos, em dois momentos analíticos: a caracterização da estrutura institucional e a investigação da agência das delegações. Primeiro, empreende-se uma interpretação histórica da governança dos oceanos a partir de seus desenvolvimentos institucionais. No segundo momento, propõe-se um quadro de análise de perfil de delegações em negociações multilaterais com enfoque burocrático-organizacional, construído sobre tipos ideais de representação. A partir da abordagem teórico-metodológica utilizada, os dois esforços analíticos são avaliados conjuntamente na prática das negociações sobre BBNJ. Os resultados apontam que a questão está inserida em um contexto institucional da governança dos oceanos caracterizado por instituições historicamente estabelecidas, como a soberania e o princípio da liberdade dos mares, e instituições recentes em ascensão conflituosa e acomodação normativa, como normas de conservação e de desenvolvimento, sob o vetor da apropriação. Na Conferência BBNJ, há assimetrias de representação em favor de um pequeno grupo de Estados com grande capacidade de exploração de recursos, as potências tecnológicas. Nas negociações, delegações maiores e mais diversas utilizam seus recursos, enquanto delegações com maiores limitações reconhecem as adversidades estruturais e buscam alternativas. Conclui-se que o perfil de delegações está relacionado com a capacidade de negociação, associado a assimetrias de poder, bem como à diversidade de perspectivas na interação com instituições. Ademais, o processo de negociação é restringido por persistência de interesses soberanistas, por problemas de equidade de representação e por limites do multilateralismo e do direito internacional como instituição.

The sustainable use and conservation of biodiversity beyond national jurisdiction (BBNJ) remains without a unified institutional regulatory framework. Being perceived as a gap in ocean governance, the issue became object of multilateral negotiations, culminating in the Intergovernmental Conference to establish an international legally binding instrument on BBNJ, beginning in 2018 and ongoing. The aim of this undergraduate thesis is to understand the negotiation process on BBNJ based on the relation between national actors, represented by their delegations, and the institutional context. It is made use of constructivist and English School approaches, considering the co-constitution between agency and structure within a sociological and historical institutionalism. Quali-quantitative methods are used, in two analytical moments: the characterization of the institutional structure and the investigation of the agency of delegations. First, a historical interpretation of ocean governance based on its institutional developments is undertaken. In the second moment, it is proposed an analytical framework of delegations profile in multilateral negotiations with a bureaucratic-organizational focus, built on ideal types of representation. Considering the theoretical-methodological approach used, the two analytical efforts are jointly evaluated in the practice of negotiations on BBNJ. The results indicate that the issue is embedded in an institutional context of ocean governance characterized by historically established institutions, such as sovereignty and the principle of the freedom of the seas, and recent institutions in conflictive rise and normative accommodation, such as conservation and development norms, under the vector of appropriation. At the BBNJ Conference, there are asymmetries of representation in favor of a small group of States with great resource exploration capacity, the technological powers. In negotiations, larger and more diverse delegations use their resources, while delegations with greater limitations acknowledge structural adversities and seek alternatives. In conclusion, the delegations profile is related to negotiation capacity, associated with power asymmetries, as well as with the diversity of perspectives in the interaction with institutions. Furthermore, the negotiation process is constrained by the persistence of sovereignty interests, by problems of equity of representation and by the limits of multilateralism and international law as an institution.