Racionalidade neoliberal e ciências humanas no novo ensino médio : estudo de caso em escola estadual de Porto Alegre (RS)

Abstract

O objetivo do presente trabalho é analisar as percepções de docentes de Ciências Humanas de uma escola estadual de Porto Alegre (RS) sobre o Novo Ensino Médio e suas relações com uma perspectiva crítica e cidadã. A pesquisa foi construída a partir do Programa de Residência Pedagógica, que me inseriu em uma escola da rede pública de Porto Alegre (RS). Localizada em um bairro central da cidade, a escola possui um corpo estudantil heterogêneo e é atravessada pelos percalços da educação pública e dos mecanismos de descaso do Estado, que afetam a qualidade do ensino-aprendizagem. Em 2022, foi iniciada a implementação do Novo Ensino Médio (NEM), reforma que postulou uma série de alterações na LDBEN. A proposta reside em uma flexibilização do currículo e implementação de itinerários formativos que podem ser escolhidos pela escola e pelos estudantes. Um dos efeitos dessa nova legislação é a retirada da obrigatoriedade das disciplinas de Ciências Humanas do currículo, que possuem função fundamental para a formação de uma sociedade democrática. Para compreender o NEM no contexto das reformas escolares, parto de uma perspectiva crítica da racionalidade neoliberal, que passou a organizar a vida social e impregnar o campo escolar com a cultura empresarial e o culto à inovação, de modo que a formação integral e cidadã passou a ser substituída pela formação de sujeitos que se comportam como empresas. A partir desse substrato teórico, realizo uma pesquisa de caráter qualitativo, iniciada através da observação participante. De forma complementar, são realizadas entrevistas com os docentes de Ciências Humanas da escola em questão e um levantamento bibliográfico em torno das reformas do Ensino Médio, além de pareceres da área educacional acerca do NEM. A partir deste trabalho, percebe-se que o NEM se liga à lógica normativa de conjunto da racionalidade neoliberal, sendo um dispositivo de eficácia que age sobre docentes e discentes e leva à fabricação de neo sujeitos, além de nos conduzir a uma era pós-democrática. Leva também a um processo de pedagogização dos professores, a uma pedagogia contra o outro entre os estudantes e à perpetuação, sob nova roupagem, do dualismo educacional sob a égide da divisão social do trabalho.

The objective of this study is to examine how Humanities teachers from a public school in Porto Alegre (RS) perceive the New High School and its connections to critical thinking and civic engagement. The research was conducted as part of the Pedagogical Residency Program, through which I was assigned to a public school in Porto Alegre (RS). Situated in a central neighborhood of the city, the school has a heterogeneous student body and faces the challenges of public education and by the neglectful mechanisms of the State, which directly influence the quality of teaching and learning. In 2022, the implementation of the New High School (NHS) commenced, introducing a reform proposing numerous alterations to the LDBEN. This initiative entails curriculum flexibility and the establishment of formative pathways that schools and students can select. One significant consequence of this new legislation is the elimination of mandatory Humanities subjects from the curriculum, despite their crucial role in shaping a democratic society. To grasp the NHS within the realm of educational reforms, I adopted a critical perspective on neoliberal rationality, that illustrates how neoliberal ideals have structured social dynamics and infiltrated the educational sphere with a culture of entrepreneurship and innovation worship, ultimately prioritizing the creation of individuals who mimic enterprises over fostering comprehensive and civic education. Drawing upon this theoretical foundation, I undertake qualitative research, starting with participant observation. Furthermore, I conduct interviews with Humanities teachers from the school, alongside a bibliographic review on high school reforms and educational perspectives concerning the NHS. This work reveals that the NHS is tied to the normative logic of neoliberal rationality, functioning as an apparatus of efficacy, affecting both teachers and students, resulting in the emergence of new subjects and pushing us towards a post-democratic era. Moreover, it leads to a process of pedagogization of teachers, a pedagogy against the other among students and perpetuates educational dualism under the guise of the social division of labor.