Entre a participação genuína e a simulação : uma análise da campanha Quero Escolher da Philip Morris sob a ótica do astroturfing

Abstract

O emprego do astroturfing como estratégia comunicacional visa articular sentidos públicos através da criação de grupos simulados para influenciar a opinião pública e, assim, corromper o debate sobre temas importantes para a sociedade. Essa prática comunicacional que sobrepõe os interesses privados das organizações ao interesse público levanta questões éticas e desafia os princípios democráticos. Neste contexto, este trabalho objetiva analisar os indícios de como a Philip Morris, uma gigante global da indústria do tabaco, utiliza a campanha Quero Escolher para influenciar o debate público a favor da regulamentação dos Dispositivos Eletrônicos para Fumar (DEFs) no Brasil à luz do astroturfing. Dada a relevância social e acadêmica de refletir criticamente acerca das implicações negativas da adoção de estratégias comunicacionais de caráter dissimulado para a esfera pública, este estudo se justifica. Por meio do método qualitativo de estudo de caso, orientado pelo paradigma indiciário, foram analisados a campanha e o contexto em que ela está inserida, permitindo a identificação de indícios que apontam para o astroturfing. A pesquisa bibliográfica em livros e artigos acadêmicos especializados possibilitou a fundamentação teórica sobre Comunicação Pública e suas dimensões (Weber, 2007, 2017; Gomes, 2008; Carnielli 2017, 2021; Esteves, 2011; Maia, 2008; e Habermas, 1997, 2003a, 2003b), bem como a respeito da Teoria Crítica das RP, comunicação organizacional, assimetrias de poder e astroturfing (Silva 2015, 2019; Henriques, 2018; Henriques e Silva, 2014; Peruzzo, 1986; Carnielli, 2021, 2022; Baldissera 2008, 2009, 2017; Silva, 2018; e Ramos, 2024). A pesquisa documental envolveu a análise de legislações, resoluções e relatórios de entidades de saúde, materiais produzidos e divulgados pela Philip Morris, e conteúdos jornalísticos, a fim de encontrar indícios da atuação da organização. Complementarmente, a análise de conteúdo foi aplicada para a interpretação e categorização das estratégias observadas. Ao final, conclui-se que, embora a Philip Morris não oculte sua autoria na campanha, ela a minimiza estrategicamente, valendo-se de fundamentos do astroturfing para instrumentalizar uma ferramenta democrática de consulta pública promovida pela Anvisa para influenciar o debate público sobre a regulamentação dos DEFs no Brasil e defender seus interesses privados em detrimento do interesse coletivo.

The use of astroturfing as a communication strategy aims to shape public perceptions through the creation of simulated groups to influence public opinion, thereby corrupting the debate on issues crucial to society. This communication practice, which prioritizes private organizational interests over the public interest, raises ethical concerns and challenges democratic principles. In this context, this study seeks to analyze evidence of how Philip Morris, a global giant in the tobacco industry, uses the Quero Escolher campaign to influence public debate in favor of regulating Electronic Nicotine Delivery Systems (ENDs) in Brazil, through the lens of astroturfing. This study is justified by the social and academic relevance of critically reflecting on the negative implications of adopting covert communication strategies for the public sphere. Employing a qualitative case study method guided by the evidentiary paradigm, the campaign and its context were analyzed to identify evidence of astroturfing. A bibliographic review of books and academic articles provided the theoretical foundation on Public Communication and its dimensions (Weber, 2007, 2017; Gomes, 2008; Carnielli, 2017, 2021; Esteves, 2011; Maia, 2008; and Habermas, 1997, 2003a, 2003b), as well as on Critical Theory of Public Relations, organizational communication, power asymmetries, and astroturfing (Silva, 2015, 2019; Henriques, 2018; Henriques & Silva, 2014; Peruzzo, 1986; Carnielli, 2021, 2022; Baldissera, 2008, 2009, 2017; Silva, 2018; and Ramos, 2024). The documentary research included the analysis of legislation, resolutions, and reports from health entities, materials produced and disseminated by Philip Morris, and journalistic content to uncover evidence of the company’s practices. Additionally, content analysis was applied to interpret and categorize the observed strategies. The findings suggest that, although Philip Morris does not conceal its authorship of the campaign, it strategically minimizes it, employing astroturfing principles to instrumentalize a democratic public consultation tool promoted by Anvisa. This strategy aims to influence public debate on the regulation of Electronic Smoking Devices (ESDs) in Brazil, prioritizing private interests over the collective interest.