Trabalho e suicídio

Abstract

O objetivo desse estudo foi analisar a relação do trabalho, especialmente a organização do trabalho, com o comportamento suicida. O comportamento suicida é entendido como resultado de uma complexa interação entre diversos fatores. O trabalho, no entanto, é muitas vezes negligenciado ou pouco explorado como um dos fatores contribuinte. Pretendeu-se também avaliar se os profissionais de segurança e saúde no trabalho, em especial aqueles ligados diretamente às empresas e os auditores-fiscais do trabalho, realizam a abordagem e análise do suicídio relacionado ao trabalho. O embasamento teórico amparou-se em: estudos sobre os sentidos do trabalho e a sua centralidade na formação da identidade, em especial à luz do modo de produção capitalista e sob os reflexos da reestruturação produtiva e do neoliberalismo; o suicídio ao longo da história; os estudos de Karl Marx e Émile Durkheim, que extrapolaram questões individuais e atribuíram as questões sociais como causas do suicídio; as limitações para a prevenção, como os mitos, estigmas e a patologização, e por último, buscou-se pesquisas sobre a relação do trabalho com o suicídio. A metodologia consistiu em uma etapa qualitativa, utilizando-se do “estudo de casos múltiplos”, e uma etapa quantitativa, com aplicação de questionário aos auditores-fiscais do trabalho sobre suicídio relacionado ao trabalho. Duas mortes por suicídio e duas tentativas de suicídios foram discutidas na etapa qualitativa. Os resultados apontaram que o trabalho foi decisivo para os desfechos dos suicídios e das tentativas de suicídio, tendo sido verificado relação dos mesmos com fatores de risco psicossociais, assédio moral e, em dois casos, verificou-se relação com os processos de privatização pelos quais as empresas passavam, chamando a atenção para a forma violenta como essas reestruturações são feitas. A pesquisa quantitativa apresentou taxa de respostas de 59,6% e teve como resultado: 81,4% dos auditores- fiscais do trabalho acredita que faz parte de suas atribuições realizar análise de suicídios e de tentativas de suicídios relacionados ao trabalho; 89% nunca realizou esse tipo de análise; 77% não se considera seguro de seus conhecimentos e habilidades para tal; 93% considera que não há suporte da Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) e da Escola Nacional de Inspeção do Trabalho (ENIT) para a realização desse trabalho. O estudo contribuiu para evidenciar a relação do trabalho com o comportamento suicida e a necessidade de fomentar a sua abordagem, a realização de investigações e de capacitação sobre o tema. Foram sugeridos critérios para a definição de casos suspeitos de suicídios relacionados ao trabalho e propostas para melhoria da vigilância epidemiológica e prevenção do comportamento suicida.

The objective of this study was to analyze the relationship between work, especially work organization, and suicidal behavior. Suicidal behavior is understood as the result of a complex interaction between several factors. Work, however, is often overlooked or little explored as one of the contributing factors. The aim was also to evaluate whether occupational health and safety professionals, especially those directly connected to companies and the labor inspectors, approach and analyze work-related suicide. The theoretical basis was supported by the following: studies on the meanings of work and its centrality in the formation of identity, especially in light of the capitalist mode of production and under the reflections of productive restructuring and neoliberalism; suicide throughout history; the studies of Karl Marx and Émile Durkheim, which extrapolated individual issues and attributed social issues as causes of suicide; the limitations to prevention, such as myths, stigmas and pathologization, and finally, research was also sought on the relationship between work and suicide. The methodology consisted of a qualitative phase, using the “multiple case study”, and a quantitative phase, with the application of a questionnaire to labor inspectors on work-related suicide. Two deaths by suicide and two attempted suicides were discussed in the qualitative phase. The results showed that the work was decisive for the outcomes of suicides and suicide attempts, with a relationship between them and psychosocial risk factors, harassment and, in two cases, a relationship with their company’s privatization process, drawing attention to the violent way in which these restructurings are carried out. The quantitative survey presented a response rate of 59.6% and resulted in: 81.4% of labor inspectors believe that it is part of their duties to analyze workrelated suicides and attempted suicides; 89% have never carried out this type of analysis; 77% do not consider themselves confident in their knowledge and skills to do so; 93% consider that there is no support from the Secretary of Labor Inspection (SIT) and the National School of Labor Inspection (ENIT) for carrying out this work. The study contributed to highlighting the relationship between work and suicidal behavior and the need to encourage its approach, carrying out research and training on the topic. Criteria were suggested for defining suspected cases of work-related suicide and proposals for improving epidemiological surveillance and preventing suicidal behavior.